terça-feira, 16 de agosto de 2016

CARTA DE REPÚDIO AO CHAMAMENTO PÚBLICO DO GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS PARA A CELEBRAÇÃO DO TERMO DE COLABORAÇÃO COM COMUNIDADES TERAPÊUTICAS

CARTA DE REPÚDIO AO CHAMAMENTO PÚBLICO DO GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS PARA A CELEBRAÇÃO DO TERMO DE COLABORAÇÃO COM COMUNIDADES TERAPÊUTICAS


Ao Governador do Estado de Minas Gerais, 

A Frente Mineira de Drogas e Direitos Humanos, organização social composta por diversas entidades na defesa dos direitos dos cidadãos que fazem uso de drogas, manifesta sua indignação diante da situação absurda em que se encontra a fragmentada, incongruente e nefasta Política de Drogas do Estado de Minas Gerais. Os absurdos contidos no Relatório de Vistorias das comunidades terapêuticas do Programa Cartão Aliança pela vida, elaborado pela Secretaria de Estado de Saúde - SES, denunciam inúmeras e graves violações de direitos humanos. No entanto, o mesmo governo que realizou esse trabalho, busca através de um edital da Secretaria de Estado de Defesa Social – SEDS, por meio da Subsecretaria de Políticas sobre Drogas – SUPOD, financiar novamente o mesmo tipo de entidade em detrimento dos investimentos da rede pública de Saúde Mental. 

Nós, entidades Defensoras dos Direitos Humanos, do Sistema Único de Saúde – SUS, da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial e da Redução de Danos, sempre nos posicionamos em defesa de uma política de drogas que cuide em liberdade das pessoas em uso abusivo, promova autonomia e respeite a diversidade de gênero e religiosa de todas as pessoas. O Estado de Minas Gerais ao abrir um novo edital de colaboração com esse setor contraria as deliberações da IV Conferência Nacional de Saúde Mental Intersetorial/2010 e XIV Conferência Nacional de Saúde/2011, bem como sistemáticos alertas produzidos por diversas entidades, a exemplo do Conselho Federal de Psicologia, que em 2011 publicou o Relatório da 4ª inspeção de direitos humanos: locais de internação para usuários de drogas, do Fórum Mineiro de Saúde Mental através do Vídeo “Abusos e Violações de Direitos Humanos em comunidades terapêuticas: relatos de uma realidade anunciada” (2015) e do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo com o Dossiê Relatório de inspeção de comunidades terapêuticas: mapeamento das violações de direitos humanos (2016). Os resultados de tais documentos assim como as incontáveis matérias veiculadas pela imprensa denunciam graves situações de tortura, morte, privação de liberdade, violação de correspondência, desrespeito à identidade religiosa, homofobia, uso de trabalho forçado e não remunerado, e diversas outras formas de castigo e constrangimento.

Assim como as informações presentes no Relatório de Vistorias em comunidades terapêuticas da Secretaria de Estado de Saúde - SES, que além de corroborar com os demais documentos citados, demonstra a irresponsabilidade do Estado em manter repasse de recursos públicos, do Sistema Único de Saúde - SUS para entidades privadas que ferem todos os preceitos da saúde pública, violam direitos humanos e descumprem de maneira escancarada os critérios mínimos de habilitação contidos nos editais demonstrando, também, a real ineficácia da tentativa de regulação de tais entidades. 

Como abrir novo chamamento de entidades que descumprem em sua totalidade os critérios mínimos do Edital de habilitação de programa já existente no Estado? Como é possível legitimar, através de financiamento público, as práticas de constrangimento, preconceito e desrespeito às pessoas que usam drogas? Seria punição ou tratamento? Ademais, onde estão os recursos que deveriam ser destinados à Rede de Atenção Psicossocial – RAPS/SUS? O que nos assombra é que o financiamento das comunidades terapêuticas contratadas pela Secretaria de Defesa Social é feito com os recursos do Fundo Estadual de Saúde, enquanto o SUS e os municípios agonizam pela falta de recursos. Além do mais, não poderíamos deixar de nos indignar diante do fato da Subsecretaria de Política de Drogas - SUPOD ter a frente como cargo de Superintendente, um gestor que é proprietário de comunidade terapêutica e tem se apresentado publicamente em defesa dos seus próprios interesses, ferindo o princípio da impessoalidade no gerenciamento de políticas públicas. O que demonstra os interesses escusos que estão por trás deste chamamento público e nos faz questionar, ainda mais, o modo como o Estado vem conduzindo duas políticas de drogas no mesmo governo. 

Nesse sentido, exigimos do Governador Fernando Pimentel uma resposta diante da flagrante contradição exposta pela abertura desse chamamento público que evidencia as inúmeras incongruências já citadas, em um momento no qual os serviços da rede substitutiva de saúde mental encontram-se, inclusive, sem repasse de recursos estaduais, prometidos há mais de 1 ano.
 
Assim, manifestamo-nos contrários a abertura de tal chamamento, em defesa da construção de uma Política Pública de Drogas que efetive o investimento de recursos em serviços públicos e que mantenha coerência em suas diretrizes pautando o cuidado e o respeito a dignidade humana.

Belo Horizonte, 10 de Agosto de 2016 

FRENTE MINEIRA DROGAS E DIREITOS HUMANOS 
FÓRUM MINEIRO DE SAÚDE MENTAL 
SINDICATO DE PSICÓLOGOS DE MINAS GERAIS

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