quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

JUSTIÇA, VINGANÇA E REPARAÇÃO




Recentemente vi na TV uma reportagem sobre um traficante, ou ex traficante, que estava foragido da justiça. Ele vivia há dez anos no interior de Minas, com outra identidade. Nestes dez anos ele se tornara lavrador, e vivia apenas do cultivo da terra em uma pequena propriedade. Os moradores locais se assustaram com essa descoberta do seu passado, e diziam a todos que se tratava de um homem gentil, pacato, integrado à comunidade. Agora, descoberto pela Justiça, ele seria julgado e encaminhado para cumprir pena por crime hediondo em um dos presídios do país. O âncora do jornal televisivo exaltou a competência da Justiça em descobrir, mesmo depois de tantos anos, este criminoso disfarçado e dar a ele o devido destino.

Ouvimos todos os dias que uma das funções, talvez a principal, do sistema prisional é promover a reabilitação do condenado para que ele volte “recuperado” para a sociedade. No caso em questão, o indivíduo não estava mais cometendo crimes e exercia uma atividade social útil. Agora, alcançado pelos braços da lei, retornaria ao convívio dos criminosos e, de fato, seria provavelmente inserido novamente no mundo do crime.

Há que se objetar, no entanto, que uma outra função, para muitos a principal, é fazer o indivíduo pagar pelos crimes que cometeu. Assim, entendem estes, a verdadeira justiça estaria sendo feita. Não importa, de acordo com esta compreensão, que o indivíduo em questão esteja já recuperado, integrado à sociedade onde vive. Uma vez que ele não cumpriu a pena prevista em lei pelos seus crimes do passado, deve ser punido. Não importa mesmo que, ao cumprir a sua pena, ele esteja sendo novamente inserido no mundo do crime, o que possivelmente ocorrerá.

Frequentemente ouço e leio nos noticiários alguém clamando por justiça diante de um crime qualquer cometido. Há pouco tempo a filha de um amigo foi assassinada, de forma vil, à sangue frio, durante um assalto. O sofrimento vivido por aquela família é ainda imenso. A dor é de uma perda irreparável. A única justiça, de fato, neste caso, seria ter o bem perdido reparado, seria ter este ente querido de volta. Esta justiça é, lamentavelmente, impossível de ser realizada por meios humanos. Esta família em questão se organizou em torno de um movimento que preconiza a paz, achando aí uma forma de, ao mesmo tempo em que manifesta e suporta sua dor, contribuir para uma sociedade mais justa.

Infelizmente, na maioria das vezes, o que vemos como clamor por justiça, não passa de desejo de vingança: se não pode se ter o bem reparado, que ao menos alguém sofra por essa perda. A ideia de um sistema prisional que tem como principal objetivo a recuperação do indivíduo para a sociedade não passa, na maioria das vezes, de mera falácia. Quando alguém perde a vida, não há reparo possível para a família ou para a vítima. Se há algum reparo possível é para a vida do próprio criminoso, reparo este que certamente terá repercussão na sociedade em que ele vive.

Nosso sistema prisional e de justiça é pródigo em cometer injustiças. Pessoas que cometeram crimes há anos são muitas vezes condenadas quando já não oferecem riscos para a sociedade, quando já estão muitas vezes reabilitados. Tal fato se deve em parte à morosidade burocrática do sistema. Por outro lado, indivíduos em plena atividade criminosa aguardam anos por um julgamento. Se se é de uma classe economicamente favorecida, a quantidade de recursos e liminares
podem adiar o julgamento ad infinitum.

Este modelo não recupera. Na maioria das vezes ele piora o indivíduo. As prisões estão cheias de réus primários, de pouca periculosidade que ali entram em contato com criminosos contumazes, escolados no submundo do crime. Enquanto isso, a sociedade que clama mais e mais por vingança, reproduz os criminosos que ela pretende combater.






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